quarta-feira, 4 de julho de 2018

Presença



A primeira vez que te vi foi num bailado.
Não sei ao certo se era um maracatu ou samba de roda,
Mas sei que tua presença trazia a reminiscência
Dos cantos que embalaram os nossos devaneios.
Perdi a conta de quantas vezes te vi pela rua
Saudando o que restava de massa asfáltica
Num sapateado incomum, sem precedentes.
E com alegria eu vi você sentada nos bancos escolares,
Aqueles mesmos que te negaram há alguns anos.
Encontrei a tua caligrafia em livros de sucesso,
Em todos os muros que registram a nossa passagem
Por este mundo que se movimenta pelos recados.
O teu rosto está na revista exposta nas bancas
E no próximo programa de televisão.
Ainda falta muito, ainda falta tudo, ainda falta...
Mas se a profecia de Simonal nos alerta de que o fim da luta
Está tão próximo... E quando vemos que Luther King não estava errado,
E que Mandela sobreviveu para nos ensinar como se constrói outro mundo...
Acreditando na inata vontade do ser humano em sobreviver,
Enfrentando os imensos desafios como o infinito mar,
Com a impavidez do almirante João Cândido (nem Ulisses ousaria tanto!),
E sendo a vitória de Menelik e Jesse Owens o enterro das teorias racistas,
É possível continuarmos a mesma tarefa incansável
De semearmos a fé e a esperança de que dias melhores virão.
Eu não sei o teu nome, só sei a tua cor: é negra!

05.02.2018

Poesia selecionada como finalista do 1º CONCURSO LUÍS GAMA, do INSTITUTO JOÃO CÂNDIDO - CCN - Centro Cultural do Negro - São Paulo (SP), 2018.

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